Se quiser aceder a tudo sobre a nossa viagem ao parque nacional do Gerês incluindo preparativos e sugestões, veja a nossa página em: Parque nacional Peneda-Gerês
AL Casa da Banga – Pequeno-almoço
O nosso terceiro dia no Gerês começou com algo que é pouco conhecido na cidade, mas que ainda é a realidade em muitas aldeias por Portugal fora. Falo da visita do padeiro à porta de cada casa. Esta práctica não será conhecida por muitos que vivam em cidades ou em vilas, mas em locais mais recantados onde o supermercado não está ao virar da esquina, é práctica comum. E foi assim que nos vimos no terraço da AL Casa da Banga, ao lado da senhora Maria José à espera do padeiro, ainda antes das 8 e meia. E assim começámos o dia, à espera do pão para o nosso pequeno-almoço – e quem não gosta daquele cheirinho a pão fresco? Sem falar do sabor!

Mas esperem que não é só a visita do padeiro que se espera nas aldeias, também a do peixeiro, dos congelados e até do talho. As visitas podem não ser diárias como a do padeiro, mas são visitas que decorrem durante a semana para todos puderem fazer as compras que aqueles que vivem nas cidades, como eu, temos como garantidas.

Apesar da espera, que não foi longa, ainda antes das 9 horas estávamos sentados à mesa para um bom pequeno-almoço. O pão era uma delícia, acompanhado com manteiga, queijo, fiambre e até de bolos caseiros. Tivemos ainda direito a uns ovos mexidos que estavam no ponto, assim muito fofos. E enquanto comíamos fomos falando do frasco de Tofina que estava na bancada, aliás não se pode chamar uma casa tradicional portuguesa se ainda não viu um frasco de Tofina para o café da manhã. Talvez as gerações mais novas não conhecem este tradicional (e atrevo-me a dizer essencial) alimento, mas que fazia parte de qualquer casa nacional. Apesar de nas minhas recordações o frasco ser menos estético, mais o da figura ao lado do que o da figura em baixo.

Trilho do Poço Azul
Para o dia de hoje a lista de locais que queríamos percorrer não era longa, mas no final este dia acabou por ser um dos mais inesquecíveis da viagem. E não apenas por bons motivos.

O trilho do Poço Azul começa na Cascata do Arado e percorre uma distância de cerca de 9Km (4.5Km para cada lado). Mas para quem não tem um carro todo-o-terreno, o melhor, para salvaguardar o estado do carro, é deixá-lo ao pé do Miradouro das Rocas e percorrer o quilómetro de caminho de terra a pé até à Cascata. Isto adiciona mais dois quilómetros, um para cada lado, ficando assim a cerca de 11Km no total. Nós tínhamos visitado a Cascata do Arado no dia anterior, sem sabermos que hoje faríamos este caminho de novo. E quisemos arriscar em deixar o carro mais perto da cascata, já na estrada de terra. Não percorremos o quilómetro completo, porque realmente a estrada não está assim em tão bom estado, mas deixámos a meio, cortando um quilómetro da nossa caminhada (meio quilómetro para cada lado).
Se tiverem um carro todo-o-terreno podem estacionar o carro no parque de estacionamento que fica a cerca de 300-400 metros depois da cascata, já na primeira subida, poupando no total cerca 2,5Km incluindo uma parte da subida inicial. Mas não se iludam, que a pior parte tem de ser feita a pé na mesma. Até porque já se sabe que a dificuldade não é na distância, mas no trilho em si. E este pode-se dizer que é um desafio.
O trilho do Poço Azul não faz parte dos percursos pedestres (PR) oficiais como temos feitos até à data no Gerês, mas é sim antes considerado como um trilho selvagem. E atenção que alguns pontos deste percurso estão mal sinalizados. Contudo, este é um dos percursos mais procurados no Verão e o conselho geral é de virem bem cedo; começarem o trilho ainda antes das 9, porque rapidamente se enche, e com 10 pessoas o Poço Azul já se sente estar a abarrotar.
Mas afinal o que tantos procuram encontrar neste percurso?
Chegar à lagoa alimentada por uma cascata, lagoa essa não com uma cor azul como o nome indica, mas de cor verde. E sim, é possível nadar, mas aviso que a água é gelada, mesmo nos dias de calor. Não podes é pensar – ouvi uma senhora dizer à filha antes de se atirar à água.


O percurso que vou falar mais em detalhe foi aquele que nós fizemos ou seja, a partir de metade da estrada de terra que no total foram 11Km. A metade do caminho entre o Miradouro das Rocas e o Cascata do Arado será assim o Km 0, o ponto de partida.
- Estacionámos o carro numa das bermas, à sombra e partimos com 2 litros de água cada um. Passámos pela ponte junte à cascata do Arado e a partir daqui foi subir. A subida é de cerca 1,2Km e é aqui nesta subida que vão passar pelo último parque de estacionamento. A subida poder-se-á dizer íngreme, mas não haverá mais subidas pronunciadas como tal durante o caminho.
- Quando o caminho começar a nivelar, vão encontrar um cruzamento mais ou menos ao 1,6Km e aí vira-se à direita, seguindo pela rua da Malhadoura. Mais ou menos 200 metros à frente vão encontrar a Fonte do Curral da Malhadoura. Quando passámos por aqui, tanto na ida como na volta havia gente ao pé da fonte; quando íamos estavam a fazer lume para grelhar carne e quando voltámos estavam já a almoçar.
- Depois da fonte continua-se a descer e depois claro como tudo o que desce também sobe, começa-se a subir sempre em frente. Ao chegar ao 2.6Km passa-se pelo Curral dos Portos que fica à esquerda.
- A 200 metros à frente encontrarão outro cruzamento onde há uma placa a dizer ‘Tribela’. Aqui, o caminho mais rápido e fácil é virando à esquerda e esse é o caminho que recomendo, tendo nós feito, no regresso, o caminho que segue em frente neste cruzamento. Esta estrada, a que segue em frente, para quem vêm do Poço Azul não é má, é um bocado inclinada logo de início, mas vimos a descer. Agora imagino que subir aquele troço não seja nada divertido. Mas não pensem que é assim tão fácil este caminho que vos estou a aconselhar (virar à esquerda no cruzamento), talvez seja no início já que primeiro é a descer até à Ponte das Servas, mas depois é 50 metros a subir bem. No final da subida encontrar-se-ão de novo na estrada larga.
- A boa notícia é que o caminho não é seguir a estrada que sobe, mas sim virar à esquerda na primeira oportunidade – por trilho bastante mais estreito. Incrivelmente é neste último quilómetro que a coisa aperta. O trilho em algumas partes não é de fácil passagem. Pelo caminho passámos por um grupo de escuteiros que estavam parados em exercícios. Nem sabíamos o quanto nos iam ajudar. Passámos pelos escuteiros, seguimos caminho até encontrarmos o primeiro verdadeiro obstáculo, um boi. Sim, um boi mesmo no meio daquele trilho estreito. E até acredito que alguém os ache fofinhos e mansos, mas naquele momento aqueles cornos afiados tinham um aspecto mortal. Felizmente, os escuteiros já lá vinham e o boi ao ver tanta gente junta acabou por subir a barreira (não sei bem como) e foi assim que pudemos passar.
- Acabámos por fazer o resto do percurso ao lado dos escuteiros até chegarmos a um pequeno riacho o qual tivemos de atravessar. Andámos mais cerca de 200 metros quando finalmente chegámos ao poço azul. Ainda pensámos em ir à água, mas ela estava gelada. No entanto houve quem fosse bem mais corajoso que nós e se mandasse lá para dentro.


Agora faltava voltar para trás, pelo mesmo caminho de onde tínhamos vindo. E não erámos só nós apreensivos em fazer o mesmo percurso com receio de encontrar mais obstáculos animalescos a meio do trilho, porque ouvimos outras pessoas que chegaram depois de nós a perguntar aos escuteiros se seguindo o trilho em frente era mais fácil do que voltar para trás. Aparentemente não é!
Começámos então o caminho inverso, atravessámos de novo o riacho e eis que a poucos metros demos caras com o nosso pior receio, outro boi a meio do caminho, mas este numa atitude menos amistosa. Digamos apenas que o bater de pata no chão avisava que por ele não se passaria. Fizemos um desvio por dentro do mato e passámos devagarinho sempre com o olho no boi, não fosse ele atacar. O que faríamos se ele o tivesse feito não sei bem. E se nós olhávamos para ele, ele retribuía o gesto, seguindo-nos com o olhar. E mesmo depois de passarmos por ele e voltarmos ao trilho houve um momento de meio pânico quando o mesmo boi começou a vir atrás de nós, ou assim parecia, cada vez mais rápido. Eu já estava para começar a correr quando vimos pessoas a virem pelo caminho onde o boi tinha estado, atrás de um pastor que tinha com um grande cajado na mão. Não posso dizer que tenha gostado da experiência, aliás muito pelo contrário.
Fizemos o resto do estreito trilho sem percalços e quando chegámos outra vez à estrada larga, o menos que queríamos por esta altura era mais adrenalina e por isso decidimos descer sempre pela estrada em vez de segurimos outra vez pelo caminho que passava pela ponte das Servas. Talvez tenhamos feito mais meio quilómetro com esta alteração de percurso, mas pelo menos a estrada larga era bem melhor.


Chegámos ao entroncamento da ‘Tribela’ e continuámos o caminho inverso, mas tenho de confessar que a cada boi ou vaca que via, passava ao lado, mesmo ao longe, com uma certa apreensão. Chegámos ao carro inteiros, mas cansados. O caminho não tinha sido fácil e as dificuldades acrescidas tinham sido intensas. Se valeu a pena fazer aquele caminho? Epá se não tivesse sido a presença dos animais diria que sim, agora assim com um potencial risco de morte ou no mínimo de danos físicos não sei responder. Talvez se tivéssemos ido com um pastor como guia para lidar com os animais a experiência tivesse mais segura. E nós que nos tínhamos rido ao ver à venda um cajado por 10 euros. Afinal deve ser das coisas mais valiosas que se pode ter no Gerês.
Miradouro da Ermida
Depois de tirar uns momentos para descansar, beber água e recarregar baterias, fomos para a segunda paragem, um local muito mais calmo – o Miradouro da Ermida. O miradouro com cerca de 550 metros de altitude fica em Ermida, tal como o nome indica, uma aldeia tradicional do Gerês. O miradouro oferece uma paisagem típica da região.

Este miradouro é o ponto de partida para o trilho PR14 – Trilho do Sobreiral da Ermida, o qual percorre uma distância de 14Km. Como se vão apercebendo, o que há mais no Gerês são trilhos e o difícil é escolher aqueles que se quer fazer, já que as pernas (pelo menos as nossas) não davam para todos. Claro que poderão sempre fazer o GR50, o trilho da grande rota que percorre 190Km através do Gerês. Nós em qualquer sítio que passávamos e que víamos ou a placa ou a marca vermelha e branca, comentávamos ‘Olha, por aqui passa o GR50’.
Cascatas de Tahiti
Saímos do Miradouro por volta das 2 e meia da tarde e começámos a ir para o nosso próximo alojamento, agora em Fafião, com ideias de ir parando pelo caminho. A primeira paragem foi nas cascatas Tahiti também conhecidas pelas cascatas de Fecha das Barjas. Encontrámos várias pessoas a tomar banho na cascata de Várzeas que pelos vistos tem sido palco de acidentes mortais. Eu sei, esta viagem começa a ter um lado mórbido. Não nos aventurámos muito, até porque a esta altura tinha um dos dedos dos pés tão inchado que mal conseguia andar (as consequências de não sabermos estar quietos nas férias).

Infelizmente apesar dos avisos que estão nos placares alguém decidiu tirar a coleira ao seu cão e o cão escorregou na cascata. Não sei como é que não caiu. Mas acreditem que era morte certa. E podem confirmar nas notícias o perigo real destas cascatas. Aliás ficámos num hotel no dia seguinte onde o dono nos contou que um casal hospedado lá foi para estas cascatas nadar. A rapariga bateu com a cabeça e ficou a boiar na água enquanto o namorado dormia. Quando este acordou e a viu boiar de cabeça para baixo foi quando se apercebeu do que tinha acontecido. Não vale a pena dizer que o rapaz estava completamente desconsolado.
Mas nós quando saímos do carro apercebemo-nos que o local não devia ser seguro quando no parque de estacionamento há um lugar reservado a ambulâncias. Apenas um local onde a sua presença é requerida constantemente precisa. de um lugar reservado para estas viaturas.
Ponte da Pigarreira e Ponte de Várzeas
Acabámos por não ficar muito tempo nas cascatas e seguimos caminho. O último ponto de paragem antes do local de alojamento foi na ponte ao pé da Ponte da Pigarreira, na rua da Ponte de Várzeas. Tenho pena que o meu humor não estivesse no melhor estado quando aqui estivemos, porque o local é muito bonito. O humor não estava bom porque cada vez mais me doía o dedo e porque estava a começar a ficar com fome. E já se sabe quando uma mulher tem fome não há nada que faça o dia brilhar sem ser quando já estiver a comer. Eu confesso que sofro deste mal.


Mas reconheço que o local é muito bonito; fizemos um pequeno trajecto circular, passando pela Ponte da Pigarreira o que em si foi uma experiência. A ponte é uma ponte suspensa e por isso move-se à medida que se a vai atravessando. Também nesta zona se pode tomar banho e parece ser bastante mais seguro do que nas cascatas de Tahiti.
Próximo destino: Fafião!
E Fafião fica para a próxima semana porque eu gostei bastante desta aldeia, por várias razões, e merece um post focado apenas sobre ela.
Mas já começam a perceber porque digo que o Gerês é bonito mas não é para todos?
2 thoughts on “3ª Paragem no Gerês: da espera do padeiro à passagem pelos bois”