Visita a Nápoles – 2ª Parte

Este é o último post da viagem de novembro 2023. Passámos por Pompeia, ilha de Capri e Nápoles. Foram 5 dias cheios de emoções e descobertas que deixaram muitas memórias. Este último post passará pelo nosso último dia e meio em Nápoles, quando chegámos da ilha de Capri até o nosso voo de regresso a casa.

Um dos locais que quisemos visitar mas que no final não conseguimos foi o Museo Capella Sansevero, conhecido por uma estátua em particular, o ‘Cristo Velato‘ (Cristo Velado). Não o conseguimos visitar por ser um dos locais mais procurados de Nápoles e os bilhetes no dia em que o quisemos visitar tinham já esgotado. A estátua em mármore em tamanho real (humano) representa Jesus Cristo morto coberto por uma mortalha transparente feita do mesmo bloco do da estátua. Neste museu e capela existe muito mais para ver como por exemplo as esculturas das dez Virtudes. O bilhete de entrada para o museu custa 10 euros e podem-no adquirir através do site oficial: https://www.museosansevero.it/. É evidente que a compra atempada destes é aconselhada.

Como não conseguimos visitar o museu fomos explorar as ruas ali à volta, acabando por entrar na Chiesa del Gesù Nuovo (igreja do Novo Jesus). A visita é gratuita e é uma das igrejas mais importantes da cidade sendo talvez a mais bonita.

No século XV foi construído ali um edifício que funcionou como palácio. Este tornou-se famoso pela sua beleza interior devido aos variados e fantásticos frescos. Este palácio tornou-se um grande exemplo do Renascimento Napolitano e do Barroco. A igreja sofreu várias alterações durante o tempo e foi completamente reconstruída no século XVI. Durante a segunda guerra mundial, esta igreja sofreu danos severos quando uma das bombas atravessou o tecto sem detonar. A bomba ainda hoje se encontra na igreja. A última grande obra de restauração aconteceu em 1975 e é hoje um dos locais muitos procurados por visitantes e cristãos.

Agora nós cheios de fome e ainda a querer colocar as malas no quarto antes de ir jantar decidimos que estava mais do que na altura de comer qualquer coisa. E foi assim que experimentámos mais uma das delícias da comida Napolitana, também esta considerada como ‘comida de rua‘ (street food) – a pizza portaflogio, uma pizza margherita dobrada. Estas pizzas são vendidas por toda a cidade e é uma opção brilhante para quem quer algo rápido e continuar a seguir caminho. Com a fome com que estávamos soube-nos pela vida.

Pizza portafoglio

A nossa última noite foi passada no B&B Tecla. Como o tínhamos reservado pelo trip.com tal como em Capri, tivemos de contactar o dono para nos abrir a porta. Aconselho mais uma vez a fazerem-no com antecedência e não apenas quando chegam à porta para entrar, como nós. Felizmente os donos encontravam-se nas redondezas e a espera demorou menos de 10 minutos. Este é um bom local para quem é fanático por histórias de terror e quer vivê-las na vida real, porque o edifício era mesmo um cenário ideal para filmes com fantasmas. Nós ainda hoje pensamos que o local era antes um mosteiro ou uma cavalaria ou um outro qualquer edifício de grandes dimensões transformado em apartamentos, mas deixando a estrutura original. A única coisa que se destacava era o elevador que tinha um ar bastante mais moderno do que as grandes e altas portas de madeira carunchosa.

Vista do quarto laranja no B&B Tecla
Vista do quarto laranja no B&B Tecla

Talvez tenha sido o local para dormir mais fracote de toda a viagem, especialmente depois de andarmos durante a noite à luta com uma melga, mas pelo lado positivo o quarto tinha uma bonita paisagem para a Basilica dello Spirito Santo e para a colina onde a cidade se estendia até às catacumbas de San Gennaro. Mas atenção não estou a dizer que o B&B Tecla não é um local que não deva ser considerado, afinal a cama era enorme e o quarto estava limpo e agradavelmente decorado. É deveras um local com as suas peculiaridades.

Sendo a nossa última noite em Nápoles tínhamos que escolher da nossa longa lista de comidas o que queríamos ainda experimentar. Uma das coisas que não queríamos perder eram os cones – ‘cuoppo’. Talvez os mais conhecidos são os de peixe (di mare) que incluem camarão, lulas, mexilhão e anchovas. Também há o cuoppo di terra com croquetes, arroz, curgete. E depois existem várias variações. Tudo isto é frito, por isso não esperem uma coisa leve para o coração. Nós comemos o cuoppo di mare na Pizzeria e Friggitoria Del Purgatorio. E gostámos bastante, eu apesar de estar um bocado receosa dos peixinhos, acabei por gostar imenso. E um cuoppo deu bem para os dois, já que isto não era o jantar apenas a entrada. E aproveito para mostrar na imagem abaixo a característica oferta da comida de rua em Nápoles que inclui pizza frita (que experimentámos em Pompeia), frittata (que nunca chegámos a experimentar) e a pizza portafoglio.

Para jantar fomos ao restaurante Tandem para comer o famoso ragù napolitano, que na sua essência é carne com um molho de base de tomate muito saboroso. Nós pedimos a sandes de ragù chamada de Cuzetiello mas o pão era um bocadinho rijo demais, por isso aconselho a provarem o ragù mas com massa ou gnocchi. No entanto, não deixem de provar o ragù. Existem vários restaurantes da cadeia Tandem espalhados pela cidade de Nápoles, basta encontrarem o mais perto. Nós não tínhamos feito reserva mas sendo uma segunda-feira à noite o restaurante não estava movimentado e rapidamente arranjámos mesa.

Para acabar a noite fomos a um dos bares com a melhor selecção de bebidas da cidade, OAK Napoli Vino e Birra Artigianale. O bar é bastante pequeno mas ainda assim encontrámos dois bancos num dos balcões e uma lista imensa de bebidas. Pareceu-nos um lugar bastante popular e um bom local para passar ali um bocado.

Durante a noite tivemos uma luta à procura de uma melga mas sem barulho constante das buzinas o que foi um plus depois da nossa última noite em Nápoles na Via Casanova. De manhã tomámos um pequeno-almoço leve no B&B e partimos para as nossas últimas horas em Nápoles. Havia dois sítios que queríamos visitar, duas catacumbas, e descobrimos depois que na compra do bilhete para uma delas se pode visitar a outra sem valor acrescido. Esta oferta ou promoção tem uma validade de um ano se não conseguirem visitar os dois locais no mesmo dia. Começámos pelas catacumbas di San Gaudioso. Estas encontram-se no Quarteirão Stella, que há cerca de 10 anos era uma das zonas mais perigosas da cidade e um grande foco da máfia italiana, a Camorra. Isto mesmo nos foi explicado durante a tour. Sim, porque para visitar tanto umas catacumbas como as outras, é obrigatório participar numa tour com guia. Ambas as catacumbas são propriedade do Vaticano e portanto não é permitido filmar.


Catacumbas de San Gaudioso

Primeiro talvez é importante saber quem foi San Gaudioso?

San Gaudioso, também conhecido como o Africano, foi bispo de Abitina na Tunísia, tendo chegado a Nápoles depois de ser expelido do seu país. Em Nápoles, San Gaudioso contruiu o mosteiro de Caponapoli, introduziu a Regra de Santo Agostinho no mosteiro, instruções escritas sobre a vida monástica desde o século V até aos dias de hoje, e foi também o responsável por transferir parte das relíquias de Santa Restituta para Nápoles, que hoje se encontram na catedral da cidade. Apesar de não ser certo, pensa-se que San Gaudioso morreu entre 451 e 453 DC sendo sepultado no cemitério que ficava fora das muralhas da cidade. A sua sepultura tornou-se rapidamente local de devoação.

Posteriormente, as catacumbas tiveram de ser ampliadas e são hoje as segundas maiores de Nápoles. Durante o século XVII neste local encontravam-se principalmente sepulturas de aristocratas e clero. Envolvido nas sepulturas havia primeiro um processo de drenagem – os cadáveres eram furados e colocados em nichos para que perdessem os fluidos. Ainda hoje se podem ver os frescos das sepulturas pintados por Giovanni Balducci, um artista que se recusou a ser pago e por sua vez pediu para ser enterrado nestas catacumbas. O fresco que mais me marcou foi o da morte com os vários elementos em cada canto inferior. O seu significado: ‘ a morte está acima do poder, da coroa, do conhecimento e do tempo’.

No final da visita, tivemos o prazer de visitar ‘Il Presepe Favoloso’ – o presépio fabuloso – acreditem que só esta peça artística vale a pena a visita. Cada vez que olham para o presépio encontram mais um pormenor super interessante, naquele que é uma peça cultural da vida quotidiana combinado com um dos mais importantes eventos católicos, o nascimento de Jesus.

Catacumbas di San Gennaro

Sobre as origens de San Gennaro há algumas incertezas, mas pensa-se que nasceu por volta de 272 DC e que foi bispo de Benevento. San Gennaro foi preso durante o século IV por professar a fé cristã e foi morto por decapitação em 305 DC. O sangue de San Gennaro foi preservado em dois frascos.

E sabem que mais? Este sangue ainda hoje tem um grande impacto. Pois de acordo com a tradição em determinadas datas, 19 de setembro, 16 de dezembro e o primeiro sábado de maio, o santo faz um milagre, o seu sangue transforma-se em líquido. De acordo com a tradição, se o sangue não se liquefizer um desastre iminente vai acontecer. Se liquefizer, o dito ‘milagre’, então há um bom presságio. Verdade ou talvez não, mas as últimas vezes que não se liquefez foi em 1939 e 1940 que coincidiu com o início da segunda guerra mundial e novamente em setembro de 1943 altura em que Itália foi invadida pelos nazis. Também em 1980 quando Irpinia, localizada a 50Km de Nápoles foi atingida por um terramoto devastador. Última vez em 2020, um aviso mais ou menos atrasado do COVID? Como disse o guia, muitos sabem que não é real, ou pelo menos há várias dúvidas sobre a sua veracidade, mas faz parte da cultura naquela parte do mundo e isso tem que se respeitado, acreditemos nós ou não.

As catacumbas de San Gennaro tem dois pisos, o núcleo original remonta ao século II DC. Provavelmente começou por ser o túmulo de uma família nobre, que cedeu espaço à comunidade cristã, para também ali serem sepultados. Esta catacumba segue uma estrutura reticulada. Também aqui existe uma pia batismal encomendada pelo bispo Paulo II que se refugiou nestas catacumbas e realizou eventos cristãos como o baptismo neste mesmo local, quando tais actos eram proibidos. O piso superior, o local de sepultamento dos bispos, iniciou-se no século V quando os restos mortais de San Gennaro foram movidos para estas catacumbas. Devido aos seus restos mortais a catacumba superior tornou-se um local de peregrinação.

Estas duas tours são indispensáveis e estão apenas disponíveis devido ao grande esforço que têm havido nos últimos anos em transformar aquela zona da cidade numa zona mais segura, turística e assim melhorar a vida dos moradores que viviam, e certamente muitos ainda vivem sobre os domínios da Camorra. Em ambas as tours os guias mencionam, claro como parte do script, que são os turistas como nós que ajudam a melhorar aquela zona, ao participarmos naquelas tours, contribuímos para que os jovens que nasceram ali e que ali querem ficar o possam fazer, como por exemplo o aumento do turismo levou à possibilidade de terem contractos de trabalho permanente, expandir a equipa, etc. Penso que foi a primeira vez que ouvi falar do impacto positivo que o turismo pode ter, pois o negativo é imensas vezes discutido. E por isso faço aqui um apelo, se forem a Nápoles, não percam a oportunidade de visitar estas duas catacumbas, não só pela sociedade mas também porque são fascinantes, mostrando que as cidades romanas e gregas afastadas por milénios espreitam em vários pontos na cidade actual.

Depois de estas duas fantásticas visitas era altura de irmos para o aeroporto de Nápoles, e decidimos apanhar o autocarro. Confesso que não cheguei a perceber muito bem como funciona o sistema de autocarros na cidade. Mas chegámos ao aeroporto depois de uma viagem bem apertada. Já no aeroporto comprámos umas sandes com burrata e foi uma das melhores coisas que comemos na viagem. Vale tudo até ao momento da partida!

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