Roteiro na Irlanda: da Irlanda do Norte a Donegal

Índice desta página

  1. Irlanda
  2. Percurso desta viagem
  3. Preparativos para a viagem
  4. Irlanda do Norte
  5. Thyme & Co em Ballycastle
  6. Carrick-a-rede
  7. Miradouros de Magheracross & Gortmore
  8. Ferry em Magilligan Point
  9. Chegada à República da Irlanda
  10. Malin Head
  11. Yellow Pepper em Letterkenny
  12. Dormir em Procklis
  13. Glenveagh National Park
  14. Errigal Mountain
  15. Miradouros e cascata Crolly
  16. Praia em Maghery
  17. Ardara
  18. Assaranca Waterfall
  19. Maghera Beach & Caves
  20. Sliabh Liag (Slieve League)
  21. Secret Waterfall
  22. Vila de Donegal
  23. Castelo de Donegal
  24. Mill Park Hotel
  25. Música irlandesa ao vivo
  26. Londonderry/Derry
  27. The Peace Bridge
  28. Guidhall
  29. Walls
  30. Derry Girls Mural
  31. Última hora na Irlanda do Norte

Apesar de não ser planeado, visitar a Irlanda tornou-se quase como uma tradição. Nos últimos 5 anos, desde 2019, que visitamos este país uma vez por ano. Ou melhor dizendo estes dois países, a Irlanda do Norte, parte do Reino Unido, e a República da Irlanda, parte da União Europeia.

Ao contrário do que se pode esperar não há controlo nas fronteiras entre estes dois países, passando-se com toda a facilidade de um lado para o outro. E não é assim tão fácil de nos apercebermos quando cruzamos a fronteira, a subtileza da transição é isso mesmo, subtil. Conduze-se do lado esquerdo da estrada independente em que Irlanda se esteja a viajar. Já o dinheiro muda, de um lado a libra, do outro o euro. Mas se a fronteira política delimita os dois países, à fronteira física isso pouco interessa. Em todo o lado é Irlanda, com as suas paisagens verdejantes ponteadas de pontos brancos, as dramáticas falésias e planaltos que parecem não ter fim.

Zona costeira da Irlanda do Norte

Esta é a segunda road trip que fazemos pela Irlanda, desta vez com foco especial no condado de Donegal. Da última vez tínhamos percorrido de Cork, a sul da Irlanda, até Sligo, a oeste (ver post aqui). Desta vez íamos de Belfast até Donegal, a zona noroeste, numa viagem de 4 dias.


Chegar a Belfast a partir de Londres é num instante. Basta um voo de 1 hora e pouco onde os preparativos para a aterragem começam quando ainda mal nos instalámos. O aeroporto internacional de Belfast não fica no centro da cidade, mas para quem quer visitar Belfast basta apanhar o autocarro 300. Se, no entanto, o percurso da viagem incluir a zona costeira ou como nós, atravessar o país, o melhor é mesmo alugar um carro.

O percurso para esta viagem foi delineado como mostrado no mapa abaixo.

Para aceder ao mapa interactivo com legenda de cada paragem, use o seguinte link: https://www.google.com/maps/d/edit?mid=1Y_QgUa5MFamBRwqBKlUHCladQY608Uk&usp=sharing

Como habitual, aconselha-se a comprar os bilhetes com alguma antecedência. Nós comprámos os bilhetes com cerca de 3 meses de antecedência e ficaram a menos de £50 (ir e vir). Considerando também que comprámos os bilhetes para o último fim-de-semana de agosto que ainda é considerado altura alta.


Para os locais onde passar as 3 noites escolhemos pontos estratégicos. Houve vários factores que influenciaram a escolha como ter estacionamento e estar localizado de maneira a evitar adicionar mais tempo de viagem. Como erámos 3 e não nos importávamos de partilhar o quarto, escolhemos locais que ofereciam essa opção, por assim também ficar mais em conta financeiramente.

Antes de fazermos as marcações fizemos uma pesquisa no Booking, Airbnb e websites oficiais dos locais escolhidos. Foram então estas as paragens e valores associados.

  • Em Letterkenny; marcámos pelo Airbnb num celeiro reconstruído (sem pequeno-almoço incluído), £144.58 (£48 por pessoa)
  • Em Andara; marcámos pelo Booking em Bayview Country House B&B (com pequeno-almoço incluído), £126 (£42 por pessoa)
  • Em Donegal; marcámos pelo website do hotel de Mill Park Hotel (com pequeno-almoço incluído), 220 euros (73 euros por pessoa)

No total em acomodação cada um de nós gastámos cerca de £140 pelas 3 noites.

Durante os próximos posts, à medida que vou falando dos vários locais por onde passámos, falarei também em pormenor das nossas experiências em cada uma destas acomodações.

Para o primeiro local não consigo encontrar o link através do Airbnb, possivelmente porque apenas fazem marcações para o Verão. Mas deixo em baixo os links para os outros dois locais. Em Donegal, fizemos a marcação através do próprio website do hotel, uma vez que ficava mais barato do que pelo Booking.com.


  • Tempo – aconselho a levarem um impermeável independentemente da altura do ano. O tempo é bastante instável e muda com uma rapidez enorme. Mesmo no Verão podem apanhar episódios de chuva e nevoeiro.
  • Dinheiro – se viajarem em ambas as partes da Irlanda não se esqueçam que a moeda não é a mesma. Em norma, todos os locais aceitam cartão não sendo necessário levarem dinheiro convosco.
  • Conduzir – lembrem-se que na Irlanda, em qualquer zona, se conduz do lado esquerdo da estrada.
  • Flexibilidade – Isto mais uma vez tem a ver com o tempo. Mesmo com chuva a Irlanda é maravilhosa, mas quando entra o nevoeiro talvez seja melhor pensar em refazer os planos. E há imensas coisas para se pode fazer mesmo quando chove, como visitar destilarias, museus, igrejas e claro aproveitar a deliciosa cozinha irlandesa.

Depois de todos os preparativos, a viagem chegava num fim-de-semana prolongado. Aterrámos em Belfast às 9 da manhã, sem atrasos, o que nos dias que correm é uma raridade.

Escolhemos o carro como forma de nos movimentarmo na Irlanda, o qual nos recebeu no aeroporto mal chegámos. O percurso era intenso, tínhamos delineado um itinerário bastante compacto incluindo de certa forma alguma flexibilidade, por exemplo se não visitássemos um dos locais no final do dia, fá-lo-íamos no dia seguinte de manhã. Para a primeira parte da viagem tínhamos escolhido visitar alguns locais da costa da Irlanda do Norte e atravessar de ferry de Magilligan Point para a República da Irlanda.


Como os nossos voos tinham sido bastante cedo nenhum de nós tinha ainda tomado o pequeno-almoço. Decidimos durante o caminho entre o aeroporto de Belfast até Carrick-a-rede, o primeiro local que queríamos visitar, parar para comer qualquer coisa. Foi assim que nos vimos numa pequena vila típica irlandesa, Ballycastle. Uma das coisas que me surpreende sempre na Irlanda é a beleza das pequenas vilas e aldeias com as suas tradicionais casas de fachadas coloridas. E em Ballycastle não era diferente.

Rua Ann em Ballycastle

Um facto histórico interessante destas fachadas coloridas é que representam o protesto dos irlandeses depois da morte da rainha Victória em Inglaterra. Com a morte da rainha, o parlamento inglês ordenou que se pintassem as portas de preto, como sinal de luto. Como protesto, os irlandeses pintaram as casas de cores garridas. E a partir daqui tornou-se uma das características das ruas irlandesas espalhadas pelo país.

Em Ballycastle, estacionámos o carro na rua principal, Ann Street. Na altura estávamos a pensar em ir ao café ‘Our Dolly’s‘, mas como este estava fechado naquele dia pedimos a um dos locais por uma referência, que nos indicou este café, Thyme and Co. Nós viemos para tomar o pequeno-almoço por isso ficámo-nos por ovos escalfados com torradas, mas este café pareceu-me ser um daqueles locais ideias para um almoço rápido com qualidade. Saladas, sandes e bolos foram alguns dos items que nos fizeram pensar duas vezes. A refeição foi simples mas bastante agradável.

Encontrámos em Thyme and Co um café com um ambiente descontraído, preços acessíveis e a menos de 10 minutos da costa.


A famosa ponte de corda na Irlanda do Norte, Carrick-a-rede, pertence ao National Trust, organização de conservação e preservação de património natural e cultural no Reino Unido. O bilhete para atravessar a ponte custa 15,5 libras entre março a outubro. Na altura baixa o bilhete custa 14 libras. No entanto, se quiserem estacionar o carro no parque de estacionamento associado à ponte, mas não atravessar a ponte, o bilhete custa 10 libras. Aconselham a comprar o bilhete online atempadamente, mas nós conseguimos entrar comprando os bilhetes no local sem qualquer problema. Entre o parque de estacionamento e a ponte tem de se atravessar um trilho junto à costa que direcciona tanto para a ponte como para o miradouro.

Trilho para Carrick-a-rede

A ponte de corda tem 20 metros e atravessá-la acabou por ser uma experiência mais emocionante (ou aterrorizante) do que aquela com que contávamos. É que a ponte sendo de corda não é fixa é quanto mais nós andavámos sobre ela mais ela mexia. Aqui só se passa em segurança com as duas mãos nas cordas laterais.

Quando lá estivemos andava um senhor a nadar no meio das rochas em baixo da ponte a tentar ‘pescar’ o telemóvel que a mulher tinha deixado cair enquanto passava pela ponte. Ficámos sem saber se encontrou o telemóvel, ou se este teria sobrevivido à queda, mas como a nenhum de nós apeteceu passar por uma experiência semelhante, passámos a ponte com todos os nossos itens de valor bem seguros.

Carrick-a-rede

Esta ponte foi erguida por pescadores de salmão em 1755 (curiosamente no mesmo ano do grande sismo em Lisboa). A ponte suspensa encontra-se a uma altura de 30 metros acima do oceano. A ponte liga a falésia, parte da Irlanda continental, à ilha de Carrick-a-rede onde antes da ponte podia apenas ser acedida por barco. A pesca nesta zona era constante no século XIX, sendo que até 1960 era normal capturar cerca de 300 salmões por dia. Nos dias de hoje, a pesca do salmão é apenas uma lembrança, a memória marcada por uma ponte de corda que ainda ali existe.

Costa da Irlanda do Norte

Depois da travessia de ida e volta na ponte, uma vez que não há outra forma de voltar para trás, apenas atravessando novamente a ponte, seguimos o trilho completando a rota circular de cerca de 2 Km.


Vista para o Castelo Dunluce do miradouro Magheracross

Como numa outra viagem já tínhamos visitado a Calçada dos Gigantes (Giant’s Causeway) e o Castelo Dunluce (ver aqui), fizemos uma paragem num dos novos miradouros construídos junto à costa, o Magheracross Car Park & Viewpoint, onde não só se tem uma vista privilegiada sobre o castelo Dunluce, como das falésias.

Miradouro Gortmore

Em seguida, fomos a outro miradouro, o miradouro de Gortmore. Tivemos de subir bastante (de carro), mas realmente a paisagem imensa dos campos e da costa irlandesa fazem valer a pena o desvio. Como estava bom tempo, a paisagem estendia-se até ao outro lado da costa, onde mais tarde naquele dia iríamos chegar de ferry. Este local é ainda mais impressionante pela estátua de Manannan Mac Lir (que significa em português filho do Mar) que representa um deus do mar da mitologia gaélica.

Estátua Manannan Mac Lir

Em ambos os miradouros o parque de estacionamento é gratuito.


Ao contrário do normal não precisámos de comprar os bilhetes de ferry com antecedência, mesmo fazendo a travessia com o nosso carro. O ferry de Lough Foyle apenas faz travessias durante a Primavera e Verão. Por exemplo para 2024 a travessia já não é feita. Quando o ferry está ativo faz a travessia de um lado ao outro, ou seja, de Magilligan Point a Greencastle e vice-versa várias vezes por dia. A viagem demora apenas 15 minutos. O bilhete para o carro com passageiros fica a 22 euros. Vale imenso a pena escolher o ferry não só porque a vista é bastante bonita durante a travessia como também se poupa imenso tempo de viagem para quem, como nós, quer ir a Malin Head. Malin Head é o ponto mais a Norte da Irlanda continental, sendo apenas ultrapassado pela ilha de Inishtrahull, o ponto mais a norte da Irlanda.

Travessia de ferry

A travessia de ferry de uma costa à outra foi rapidíssima, mal chegou a 15 minutos. Depois de sairmos do ferry em Greencastle fizemos uma paragem em Inishowen. Esperávamos um miradouro com uma vista maravilhosa para a costa, mas encontrámos apenas umas vacas a pastar no campo e um casebre abandonado. Afinal em Inishowen se tiverem tempo o que há para fazer é o trilho de Inishowen Head Loop com uma distância de 8.5Km que demora de 2 a 3 horas a percorrer (https://www.govisitinishowen.com/directory/inishowen-head-loop/).

Inishowen

Voltando para o carro e uma vez que o tempo estava bom, fantástico na verdade, fomos até Malin Head. Quando planeámos o nosso percurso tínhamos deixado este lugar com um ponto de interrogação, pois não tínhamos a certeza se teríamos tempo suficiente para conduzir até lá ou se o tempo nos deixaria. Com chuva certamente que a experiência não teria sido a mesma. Mas sem chuva ou nevoeiro, Malin Head foi um dos locais mais marcantes da viagem.

Miradouro de Malin Head

Como tinha dito no último post, Malin Head é o ponto mais a norte da Irlanda continental, onde nos encontramos frente a frente com falésias dramáticas e rochedos espalhados pela costa. A paisagem é esmagadora.

Para chegar a Malin Head o melhor é deixar o carro no parque de estacionamento, este gratuito, e seguir pelo trilho de terra. Este caminho estreito segue até ao ‘miradouro’, Malin Head viewpoint, onde se vê as duas ilhas, ou melhor os dois rochedos, Scheildren Mór e Scheildren beag. Todo o percurso pelo trilho segue junto à costa oferecendo vistas magníficas da costa e das várias formações rochosas.

Percorrer o caminho do parque de estacionamento até ao miradouro de Malin Head e depois de volta levou-nos cerca de 1 hora e pouco. Mas facilmente se passa aqui mais tempo se se quiser estender o trilho ou mesmo visitar a torre de Lloyds Signal, mesmo ao lado do parque de estacionamento. A torre já teve vários papéis como o de torre de sinalização, torre meteorológica e de estação telegráfica dos correios. De momento, a torre encontra-se em desuso. O trilho não é difícil de percorrer, quase sempre a direito, mas como é de terra batida com chuva pode tornar-se bastante escorregadio. No entanto, se o tempo permitir vale imenso a pena visitar e explorar Malin Head.


A viagem entre Malin Head e Letterkenny levou-nos 1 hora e meia. Como a meio da viagem já apetecia petiscar parámos numa pequena vila, Muff, onde vimos um pub com uma grande pintura na fachada (figura abaixo). O pub chamava-se The Squealin’ Pig. Chegámos a entrar, mas afinal não vendiam comida. Para não perder tempo acabámos por parar na bomba de gasolina ali ao lado, onde havia um pequeno supermercado, ou mais uma loja de conveniência. Acabámos por comprar não só snacks para comer antes do jantar como para o pequeno-almoço do dia seguinte.

Fachada do pub The Squalin’ Pig

Quando chegámos a Letterkenny já estava na hora do jantar e decidimos ir para o restaurante e depois então fazer o check-in na nossa acomodação. Tínhamos tido uma dica de um amigo sobre um dos melhores restaurantes em Letterkenny, o Yellow Pepper. E não foi preciso pensar duas vezes, era ao Yellow Pepper que iríamos jantar.

O edifício do restaurante foi originalmente uma fábrica de camisas é desde 1994 tornou-se neste restaurante familiar muito procurado. O restaurante manteve as paredes de pedras originais, as vigas vitorianas de ferro fundido e os pisos de madeira desgastos onde tantas e tantas pessoas pisaram desde 1800. O restaurante Yellow Pepper tem 5 salas para jantar. A nós calhou-nos uma sala coberta onde entrava a luz natural de fim de tarde. A sala transmitia um ambiente descontraído e agradável. No entanto, ficámos com pena de não termos ficado na sala principal onde o ambiente pareceu-nos mais íntimo e aconchegante. Mas não ficámos assim tão desapontados quando chegou a comida. Para tal qualidade claro que os ingredientes são locais. Eu escolhi o prato de bacalhau, ‘spanish style cod fish’, com molho de tomate, pimentos e paprica. Estava delicioso e nenhuma fotografia faz jus à qualidade dos ingredientes deste prato. Também os cocktails eram óptimos e só não bebemos mais porque ainda tínhamos de conduzir até à nossa acomodação.

Spanish style cod fish no restaurante Yellow Pepper em Letterkenny

Melhor ainda que a comida e a bebida foi o atendimento. Eu estava completamente assombrada (pela positiva) com a maneira como fomos recebidos e tratados durante toda a refeição. Não podiam ter sido mais amistosos, atenciosos e no final até nos deram indicações de como encontrar a casa onde íamos ficar. Se estiverem em Letterkenny, Yellow Pepper é o local a não perder.


Vista do nosso Airbnb

Como tinha dito anteriormente não consigo encontrar o link para o Airbnb. O que é uma pena porque foi uma óptima escolha. Não só podemos fazer o check-in à hora que quisemos, check-in esse que constava em ir buscar a chave a um determinado local dentro da quinta, como o celeiro renovado oferecia condições óptimas. O celeiro tinha dois quartos, uma cama de casal num dos quartos e duas camas de solteiro no outro, uma casa-de-banho e uma enorme sala e cozinha conjuntas. Como a quinta ficava numa zona sossegada passámos uma noite em completo silêncio.

No dia seguinte acordámos cedo e a bebericar a nossa primeira caneca de café aproveitámos para aproveitar a paisagem da nossa varanda incluindo um céu limpo azul sem nuvens. Depois de nos arranjarmos, de pequeno-almoço tomado e malas no carro, estávamos preparados para mais um dia e para a nossa próxima paragem, o parque nacional de Glenveagh, ou em gaélico Loch Ghleann Bheatha.


Saímos do Airbnb por volta das 9 e meia da manhã e seguimos para o parque nacional de Glenveagh incluindo o seu castelo e jardins. Era a minha primeira vez nesta parte da Irlanda, mas para um dos meus companheiros de viagem, vir até aqui era a oportunidade única de recordar uma das suas viagens de infância com a família.


Como se pode descrever este parque nacional? A melhor palavra é beleza. Ficámos completamente abismados quando chegámos ao parque nacional de Glenveagh, um parque com uma extensão de 16.000 hectares mesmo no meio do coração do condado de Donegal. O lago Beagh rodeado pelas montanhas de Derryveagh formavam uma paisagem indiscritível.

Paisagem do parque nacional de Glenveagh perto do Visitor Center

Pelo parque nacional espalham-se vários trilhos de distâncias variáveis desde os 2Km aos 8Km. Nós acabámos por fazer o de 3.5Km, o Lakeside Walk (caminhada junto ao lago), que nos levou desde o parque de estacionamento, este gratuito, até ao castelo e jardins. A caminhada é fácil, sempre a direito, e ainda bem que a fizemos pois deu-nos a oportunidade de desfrutar com tempo a beleza da zona envolvente. Para chegar ao castelo ou se faz este trilho ou então apanha-se o autocarro no Visitor Centre (Centro de Visitas), onde fica o parque de estacionamento. O bilhete de autocarro custa 1.5 euros para cada lado (3 euros ir e vir).

Percurso ‘Lakeside Walk’

A visita aos jardins do castelo é gratuita, no entanto para visitar o interior do castelo tem de se comprar o bilhete à entrada com um custo de 7 euros. Durante os meses de Verão (março a outubro) o castelo e os jardins estão abertos entre as 09:15 e as 17:15, enquanto que nos meses de Inverno (novembro a fevereiro) está aberto entre as 10:00 e as 17:15.

Outros trilhos que podem percorrer neste parque nacional, para além do Lakeside Walk, são os seguintes:

  • Upper Glen Walk de 8Km que demora 2 horas
  • Lough Insagh Walk de 7km que demora 1 hora e meia
  • View Point Walk de 2Km que demora 30 minutos
  • Nature Trail de 2Km que demora 30 minutos

O percurso de cada trilho pode ser visto no mapa abaixo, o qual podem adquiri no Visitor Center.

Mapa dos vários trilhos no parque nacional de Glenveagh. O mapa é gratuito e pode ser obtido no Visitor Centre.

Quando chegámos à zona do castelo quisemos ver tudo. E não só o castelo, mas também os vários jardins e até o café onde se vende almoços ligeiros, doces e bebidas. Também é nesta zona onde se encontra a loja de recordações e para questões mais prácticas, as casas de banho, que também estão disponíveis no Visitor Center.

O castelo foi construído entre 1867 e 1873 pelo arquitecto John Townsend Trench. Nessa altura a casa e propriedade em redor pertenciam a John George Adair. Adair ficou conhecido por accionar os despejos em Derryveagh no século XIX, altura em que mais de 240 pessoas tiveram de sair das terras arrendadas onde viviam.

Castelo de Glenvaegh

Ao contrário do feitio do seu dono, a arquitectura da casa reflecte uma veia romântica vitoriana oposta à arquitectura conhecida dos castelos medievais. A toda à sua volta, encontram-se os jardins acompanhados pela paisagem avassaladora do lago contrastando com as altas montanhas.

A casa e os jardins passaram para o Estado Irlandês em 1979 em modo de doação por Henry Plumer Mcllhenny, o actual dono, apenas com o pedido de poder viver ali durante o resto da sua vida.


Nesta secção vou falar de algumas das pessoas que marcaram a história de Glenveagh.

John George Adair, oriundo do condado de Laois, visitou Glenvaegh pela primeira vez em 1857. Encantado com a beleza do local, dois anos depois, em 1859, compra a propriedade e grande parte dos terrenos em redor. No total, a propriedade tinha 11.300 hectares. A seu mando, o castelo é construído entre 1867 e 1873.

Paisagem do lago Beagh e montanhas envolventes durante o percurso ‘Lakeside Walk’

Desde o início que a relação de Adair com os seus arrendatários não era a melhor, especialmente quando Adair mandou construir um lago para impedir o trespasse de gado na sua propriedade. Para além disso, Adair cobrava regularmente multas quando encontrava animais perdidos na sua propriedade privada. Isto acontecia com frequência uma vez que os arrendatários não tinham dinheiro para construir vedações que impedissem o trespasse/invasão dos seus animais. A situação agravou-se quando Adair contratou funcionários de carácter duvidoso para cobrar essas multas. Um dos seus funcionários, James Murray, um homem particularmente cruel não só cobrava as dívidas como também esteve implicado no desaparecimento de várias ovelhas pertencentes aos arrendatários.

Em novembro de 1960, James Murray é assassinado. Nunca foi possível estabelecer quem foi o assassino. Devido a este episódio, Adair fica com medo que um destino semelhante lhe calhasse e decide despejar os seus arrendatários. E foi assim que em 1861, Adair despeja 46 famílias que viviam naquela zona. Em apenas três dias, 244 pessoas perderam o seu lar. Algumas destas pessoas conseguiram arranjar alojamento em casas de familiares, mas muitos acabaram por imigrarar para a Austrália à procura de uma melhor qualidade de vida. Felizmente, muitos encontraram aquilo que procuravam.

Em relação a Adair, este morre subitamente em 1885 durante uma viagem aos Estados Unidos, numa visita ao seu negócio de grande sucesso, o rancho JA no Texas.

Cornelia Wadsworth Ritchie foi a esposa de John Adair. Cornelia, uma viúva rica de Nova Iorque visitou pela primeira vez Glenvaegh em 1873, quatro anos depois de se casar com Adair. Enquanto Adair era vivo, Cornelia passou a maior parte do seu tempo na casa do seu marido em Bellegrove, no condado de Laios. No entanto em 1887, dois anos depois da morte de Adair, Cornelia começa a passar mais tempo em Glenvaegh, depois de um incêndio em Bellegrove. Em Glenvaegh, Cornelia torna-se numa anfitriã da sociedade de quem os locais gostavam muito. Durante a Primeira Guerra Mundial, Cornelia aloja um grupo de soldados feridos belgas no castelo. Como agradecimento, os soldados construem o Belgian Walk, que ainda faz hoje parte dos jardins do castelo.

Cornelia morre em 1921, em Londres, aos 83 anos.

Arthur Porter adquiriu Glenvaegh em 1929. Arthur, professor de Belas Artes na Universidade de Harvard, tinha um grande interesse pela arquitectura medieval tendo também passado muitos anos a especializar-se na arquitectura e escultura italiana. Foi quando Arthur veio para a Irlanda juntamente com a sua mulher, Lucy Porter, que escreve a obra ‘The Crosses and Culture of Ireland’. Arthur fez parte de um dos grandes mistérios de Glenvaegh, ao desaparecer repentinamente em 1933 quando visitava a ilha de Inishbofin. Arthur nunca mais foi visto.

Henry Mcllhenny compra Glenvaegh em 1937 depois de ter alugado este lugar durante vários anos a Lucy Porter. Durante os 46 anos seguintes, Henry usa este local como casa de Verão, permitindo-lhe escapar à sua vida agitada como colecionador de arte e como membro sócio do museu de arte na Filadélfia.

O avô de Henry, John Mcllhenny, oriundo do condado de Donegal, muda-se para a América com a sua família estabelecendo-se em Filadélfia. Aqui, a família Mcllhenny torna-se rica devido à invenção bem-sucedida de um dos primeiros contadores de gás que funcionavam com moedas. Esta riqueza permitiu ao pai de Henry de se envolver em grande força na coleção de arte e de antiguidades, paixão que passa mais tarde ao seu filho.

Em 1929, Henry estuda Belas Artes na Universidade de Harvard acabando por se juntar à equipa do museu de arte da Filadélfia. Como o seu trabalho permitia a Henry que tirasse grandes períodos de férias durante o verão, Henry escolhe Glenvaegh como lugar de eleição para descansar. Durante o seu tempo aqui, Henry dedica muito do seu tempo a restaurar e mobilar o castelo tal como a desenvolver os jardins envolventes. Durante esta altura, em Glenvaegh foram recebidas plantas de todo o mundo. Também uma piscina aquecida foi construída à beira do lago.

Eventualmente, Henry decide que as viagens de ida e volta à Irlanda lhe eram demasiado cansativas e vende a propriedade ao Office of Publick Works (gabinete das obras públicas) em 1975. Em 1984, Henry autoriza a criação de um parque nacional, o parque nacional de Glenveagh. Mais tarde, doa o castelo e os jardins como presente à nação. Henry morre inesperadamente em Filadélfia aos 75 anos.


Os jardins à volta do castelo estão abertos ao público e ao percorrer os trilhos encontra-se uma grande diversidade de plantas assim como estátuas a embelezar o percurso. Como mencionado acima muito deste trabalho foi realizado por Henry Mcllhenny. Os jardins estão divididos em diferentes secções como:

  • Belgian Walk (caminho belga)
  • Italian Terrace (terraço italiano)
  • Pleasure Grounds (solo do prazer)
  • Walled Gardens (jardins murados)
  • Swiss Walk (caminho suiço)
  • Tuscan Garden (jardim tuscano)

Todas estas secções merecem o seu devido tempo com paragem obrigatória na casa do barco para uma paisagem magnífica. Actualmente já não existe uma piscina de água aquecida, mas a paisagem continua ali.

Paisagem da casa do barco

Para não perdermos muito tempo porque ainda tínhamos um grande caminho a percorrer naquele dia, decidimos voltar para o parque de estacionamento de autocarro. Mas ainda havia algo a fazer, parar no café do castelo para comer. Nada como uma chávena de chá e uma fatia de bolo num ambiente encantador como Glenveagh Castle.

Bolo de cenoura acompanhado com uma chávena de chá no café do castelo de Glenveagh

Para quem quiser mais informações sobre este parque nacional, visitem o website oficial: https://www.nationalparks.ie/glenveagh/. Claro que aconselhamos a visitá-lo assim que puder.

Vista da montanha Errigal em Gweedore

Depois de passarmos a manhã a explorar o parque nacional de Glenveagh, eis que estávamos de volta ao nosso carro. A próxima paragem era no sopé da montanha Errigal. Antes de partimos, quando ainda estávamos a delinear o nosso percurso, houve algumas conversas sobre se havíamos, ou melhor se queríamos, subir até ao topo de Errigal, uma vez que era uma das escaladas mais procuradas na zona de Donegal. A popular caminhada deve-se ao facto de Errigal com uma altura de 751 metros ser a montanha mais alta do condado. Mas bastou uma pesquisa rápida sobre a dificuldade do percurso para nos decidirmos que a paisagem na base da montanha era o suficiente para nós. Mas claro que a vista do topo deve ser espectacular, e se virmos bem o percurso ir e vir é de apenas 5.5Km. No entanto, estima-se que este percurso demora 3 horas. E já sabe o que isso significa não já? Quando se estima em percorrer 1.5Km por hora, é por o percurso de fácil não tem nada. E isso foi rapidamente confirmado com as reviews que lemos na internet onde se classifica este trilho como desafiador – ou seja, por palavras simples, difícil como cornos (para não dizer pior).

Paisagem no sopé de Errigal

Mas para quem perguntar é claro que não foi a dificuldade que nos impediu de subir, apenas não fizemos o trilho porque ainda tínhamos imensos locais para visitar naquele dia. Nós até queríamos, não deu foi tempo.

O trencho entre Glenveagh e Errigal foi um dos mais bonitos desta viagem. Aconselho até a tirarem a fotografia a Errigal e área envolvente antes de chegar à montanha mais do que depois. No entanto, se não pararem antes as paisagens depois de Errigal também são espectaculares. Nós fizemos uma paragem a cada 5 minutos incluindo dois miradouros, o Dunlewey Valley and Mount Errigal Viewpoint e mais à frente o View Point Dunlewey. Se pararem na vila de Dunlewey não deixem de visitar as ruínas da igreja velha (Old Church Dunlewey). Nós não a visitámos, uma vez que não fomos na direcção da vila, mas ainda a avistámos do miradouro.

Miradouro com vista para Dunlewey onde se avistava também as ruínas da igreja à esquerda

Uma das últimas paragens com vista para Errigal, já em Gweedore, foi uma desculpa para não só vermos a paisagem como também para fazermos um almoço rápido antes de seguirmos caminho.

Para finalizar este trecho do percurso indo já em direccção à costa parámos para visitar a cascata Crolly em Killindarragh. Para chegar à cascata parece que há um portão, o qual nunca encontrámos. Mas para dizer a verdade não andámos muito à procura de como chegar à cascata bastando-nos vê-la da estrada.

Cascata Crolly

Uma coisa que aprendi nesta viagem é que as praias da Irlanda são quase idílicas. E a praia Maghery Strand não era diferente.

Maghery Strand fica na pequena aldeia de Maghery que se encontra rodeada de praias, ilhas, lagos, colinas, grutas e arcos marítimos. Não é de estranhar que esta zona é considerada como uma das ‘Areas of Outstanding Natural Beauty’ (AoNB), áreas das quais mencionei na página sobre as Chiltern Hills em Inglaterra. Estas áreas tem um valor inestimável para o país onde existe um grande esforço de conservação e preservação. Na Irlanda existe 8 áreas, uma delas fica em Maghery. Outro exemplo conhecido na Irlanda, já na Irlanda do Norte, é a Calçada dos Gigantes (Giant’s Causeway).

Estacionámos o carro em Maghery e em menos de nada estávamos nesta praia de areia branca e fina escondida pela baía e quase vazia. Primeiro ainda nos fizemos difíceis, mas passados uns minutos já tínhamos tirado os sapatos e enfiávamos os dedos na areia. Mesmo sabendo a trabalheira que seria tirar a areia dos pés para os voltar a meter dentro de meias e ténis.

Maghery Strand

Mas valeu a pena e como miúdos a quem lhes devolve o brinquedo favorito enfiámos os pés na água. E como previsto, as calças subiam cada vez mais para entrarmos cada vez mais dentro de água. E o melhor era que a água não estava fria, quase quase dava para nos atirarmos de cabeça naquele mar sereno.

Felizes e de espírito mais leve, sacudimos a areia dos pés o melhor que conseguimos e seguimos para o bar ao lado da praia, The Strand Bar. Como o dia estava magnífico sentámo-nos na esplanada a aproveitar aquele sol que nem parecia próprio da Irlanda. Pelo menos não na Irlanda que tinha conhecido até então com chuva, nevoeiro ou frio.

Mas não foi só o tempo que nos surpreendeu, também a diversidade de paisagens por onde passámos durante a viagem. Desde praia, montanhas e vales até extensos planaltos onde as estradas se alongavam até se perder de vista. Uma mistura de paisagens tão eclética e tão memorável.

Ardara foi a vila escolhida não só para jantar, mas também como local para passar a noite. Tínhamos marcado o nosso segundo quarto no Bayview Country House B&B que ficava a cerca de 1Km do centro de Ardara. Aproveitando para andar um bocado deixámos o carro no B&B e seguimos para a vila a pé, já ao final da tarde. Fomos recebidos pela tradicional rua de casas coloridas parando num dos pubs para uma bebida antes do jantar.

Rua em Ardara

O jantar em Andara, tal como em Letterkenny, foi escolhido seguindo a recomendação de um amigo. Fomos jantar ao pub Nancy’s, um tradicional pub irlandês que há 7 gerações pertence à mesma família. Dentro do pub as várias acomodações da casa dão agora lugar a pequenas e variadas salas de jantar. A que nos calhou estava decorada com várias fotografias e peças de louça antiga.

Para jantar experimentei o chowder, uma sopa densa de peixe, muito saborosa. Vinha acompanhada também com fatias de pão escuro e manteiga. Apesar deste prato ser considerado como uma entrada dava perfeitamente como prato principal. Quando o prato principal chegou, fish and chips, a fome tinha desaparecido. Não sei se foi por isso que achei este prato um pouco fraco e não fiquei fã da crosta do peixe que era demasiado fina e estaladiça. No final da refeição houve quem ainda tivesse espaço para um Irish Coffee que veio num bonito copo de vidro.

Depois do jantar estávamos de rastos e acabámos por não explorar muito da vila. De barriga cheia e depois de um dia fantástico com muitos quilómetros percorridos, voltámos para o quarto para ficar um bocado à conversa antes de dormir.

E no dia seguinte já sabíamos que mais um dia nos esperava com mais cascatas, praias e caves.


Bayview Country House B&B, Ardara

Bayview Country House B&B, em Ardara, foi onde passámos a nossa segunda noite. A casa pertence a uma família que é quem coordena o serviço de Bed & Breakfast.

A nossa reserva incluía não só parque de estacionamento como também pequeno-almoço. O nosso quarto, como não tínhamos problemas em partilhar o mesmo espaço, era de três camas individuais. O quarto em si era bastante grande assim como a casa de banho. Durante a noite não ouvimos quase barulho nenhum e enfiados em camas confortáveis acabámos por dormir bastante bem.

No dia seguinte, fomos recebidos pela dona de casa que era quem naquela manhã estava a servir os pequenos-almoços. Com um sotaque irlandês pronunciado recebeu-nos com uma euforia contagiante.

Mesa de pequeno-almoço no Bayview Country House B&B

Quanto ao pequeno-almoço já o tínhamos escolhido no dia anterior. Isto porque funciona com um sistema que bastantes locais aderiram durante o COVID e que acabou por ficar. Neste sistema quando se faz o check-in dão um papel com as escolhas para o pequeno-almoço e tem de se assinalar o que quer. Depois nesse mesmo dia, normalmente até ao final do dia, tem-se apenas de deixar o papel na recepção e os responsáveis tratam de tudo para a manhã seguinte.

Eu tinha pedido o porridge (papas de aveia), mas depois do grande jantar do dia anterior no pub Nancy’s, acabámos por dividir uma porção entre dois. Primeiro dissemos que não queríamos, mas como a senhora nos disse que era uma receita da avó e que era muito bom, acabámos por dividir. Era bom o porridge, mas mesmo assim não bateu o melhor porridge que comi na minha vida numa das viagens à Escócia (ver aqui). Mas mesmo assim, a senhora tinha razão, o porridge era muito bom. Depois veio o full breakfast, o pequeno-almoço irlandês, que é bastante parecido com o inglês, mas pedi sem bacon e sem salsichas. Depois destes dois pratos estava a sentir-me quase tão cheia como no dia anterior ao jantar.

Chegava assim a hora de partir e em menos de nada, depois do pequeno-almoço, estávamos de volta à estrada e a deixar Ardara para trás. E o que nos esperava no percurso de hoje eram vários locais que deixaram bonitas memórias. Locais esses dos quais não se pode perder numa viagem à Irlanda.

A primeira paragem foi a caminho de uma das cascatas mais conhecidas da zona, a Assaranca Waterfall. Esta paragem foi para tirar fotografias à bonita paisagem que nos aparecia pela manhã com a continuação daquele bonito céu azul.

Uma viagem na Irlanda é mesmo assim, uma batalha constante entre o caminho que ainda se tem de percorrer e a vontade imensa de parar e com olhos de ver observar com tempo a paisagem.

Depois desta rápida paragem fomos para a cascata Assaranca. Infelizmente, na altura em que visitámos o local, andavam a fazer obras em frente da cascata, por isso a paisagem não era a mais bonita. As obras eram apenas temporárias, para realizar trabalhos urgentes de reparação da pequena ponte que passa por cima do pequeno riacho e acabaram em outubro de 2024. Mas nem as obras impediram a beleza da cascata de se destacar.

Depois de sairmos ao pé de Assaranca waterfall fomos para um dos locais que mais nos surpreendeu, a praia em Maghera. O parque de estacionamento agora é pago e ficou-nos a 4 euros. Apenas aceitam o pagamento em dinheiro.

A praia de Maghera facilmente passa despercebida, mas é realmente um dos locais a não perder. Do parque de estacionamento até à praia é mais ou menos 400 metros a andar e preparem-se para perderem-se neste local. Afinal não é uma praia qualquer.

Entrada para a praia em Maghera

A praia escondida pela baía tem um areal de quase 5Km em comprimento. E o melhor é que estava quase vazia quando chegámos. E depois a areia, super fina e branca, e tão fofa que enfiámos logo os pés nela.

Começámos a andar pelo areal até chegarmos às falésias onde encontrámos as grutas. Mas imensas grutas para explorar. As grutas escavadas na montanha Slievetooey podem ser acedidas facilmente durante a maré baixa. Durante a maré alta as grutas tornam-se inacessíveis, tanto para entrar como para sair. Tal como o mar, em Maghera Beach, não é aconselhável de ir a banhos devidos às fortes correntes.

Para além de um areal de sonho, uma paisagem magnífica e grutas fantásticas também em Maghera Beach há uma cascata. Como podem ver é impossível não se perder de amores por este local. Para mim foi um dos pontos mais altos da viagem, especialmente porque foi uma imensa surpresa. Acabámos por passar grande parte da manhã aqui e adorámos explorar as várias caves, chegar-nos perto da cascata e percorrer aquele longo areal.

Depois de Maghera Beach o nosso próximo local era também daqueles de paragem obrigatória, e talvez dos mais conhecidos no condado de Donegal, Sliabh Liag.

O caminho entre Maghera Beach e Sliabh Liag é muito bonito, recheado de paisagens com dramáticas montanhas e verdejantes vales. Vale imenso a pensa fazer este percurso pelas paisagens que vão aparecendo durante o caminho.

Chegámos a Sliabh Liag (ou Slieve League, o nome em inglês) por volta da 1 da tarde. Deixámos o carro no parque de estacionamento no Rangers Station (não no Visitor Center que fica a 4Km de distância). Este parque de estacionamento não é gratuito e ficou-nos a 5 euros por 2 horas. É possível tanto fazer o pagamento com dinheiro como com cartão. Também é aqui que encontrarão as casas de banho, se precisarem.

Deixo aqui a nota que Sliabh Liag encontra-se fechado durante todo o Inverno. Durante o resto do ano está aberto das 9:30 da manhã até às 5 da tarde.

Durante o caminho de Sliabh Liag Walk

Sliabh Liag são as falésias (cliffs) costeiras mais altas e acessíveis da Europa. As falésias estão a 600 metros acima do mar. Como podem imaginar a vista daqui é espectacular. Mas antes de chegarmos à paisagem aviso que o percurso começa com uma subida intensa que demora cerca de 15 minutos.

Para quem têm problemas de mobilidade (e não conta não estar em forma) há um autocarro que se pode apanhar do Visitor Center que fica a 4Km das falésias. Aconselham a fazer marcação dos bilhetes com antecedência e podem-no fazer através do link: https://www.sliabhliag.com/visitor-information/

Vista das falésias um pouco acima do miradouro

Existem vários percursos que se podem realizar, eu penso que o nosso foi o mais básico, que contou com 3.59Km. Percorremos o Sliabh Liag Walk até à zona do miradouro, que fica a cerca de 1.5Km do parque de estacionamento e depois subimos um pouco mais pelo carreiro até chegarmos a uma espécie de plataforma natural. A subida foi cerca de 300 metros se tanto.

Para quem procura trilhos mais longos tem-se por exemplo:

  • Cliff Path Walk que começa na plataforma do miradouro e sobe pela montanha por 2.5Km. Demora mais ou menos 3 horas ir e vir
  • Pilgram’s Path que percorre 3.5Km e demora cerca de 3.5 horas
  • Loop Walk de 13Km. Este percurso demora entre 4 e 5 horas

Estes e outros mapas podem ser adquiridos no visitor center ou no website theirishroadtrip.com. Para outros percursos também aconselho a visitarem: https://www.alltrails.com/en-gb/poi/ireland/slieve-league

Antes de irmos para Donegal ainda fizemos uma última paragem para visitar a Secret Waterfall (cascata secreta), também conhecida por Largy waterfall. Parámos o carro no miradouro Largy viewpoint e descemos a estrada até um carreiro que nos levou até à praia. Em menos de 20 minutos chegámos à praia de pedras arredondadas de onde se via um pequeno ilhéu.

Praia em Largy

A praia era muito diferente da de Maghera mas mesmo assim muito bonita. Agora de cascata é que nada. Quando chegámos a maré já tinha subido e infelizmente já não era possível aceder à gruta.

Resignados voltámos para trás até porque nesta altura o tempo começava a piorar. Afinal nem toda a viagem seria sobre a luz do sol. E depois de várias praias, cascatas e falésias, o caminho agora era para Donegal.


Tínhamos passado dois dias a explorar o bonito condado de Donegal e chegávamos agora à vila histórica que lhe dá o nome. Chegámos perto das 4 da tarde num domingo e fomos directamente para o centro da vila. Como era domingo as restrições de parque de estacionamento nas ruas da vila não se aplicavam e estacionámos numa das ruas do centro.

Como sabíamos que o nosso tempo seria limitado nesta vila decidimos que no mínimo visitaríamos o castelo de Donegal.

O castelo facilmente passa despercebido e o seu exterior pode não atrair a visita, no entanto aprendemos imenso naquela que acabou por ser uma visita guiada. A entrada para o castelo custa 5 euros e está aberto a visitantes nos meses de Verão (meio de março a finais de outubro) das 10 da manhã até às 6 da tarde, última entrada às 17:15. Nos meses de Inverno o castelo também está aberto das 9:30 às 16:00 com última entrada às 15:15.

Não sei bem de quanto em quanto tempo começam as tours guiadas uma vez que nós nos juntámos a uma quando entrámos para a primeira sala. A tour já estava a decorrer, mas o guia, um miúdo com muito entusiasmo pelo seu trabalho e história do castelo, deixou-nos juntar à tour sem problemas. Toda a visita ao castelo mesmo depois da tour terminada demorou pouco mais de meia hora.

O site oficial do castelo pode ser acedido a partir deste link: https://heritageireland.ie/places-to-visit/donegal-castle/

Fica aqui um pouco do que aprendemos sobre o castelo e seus habitantes.

De 1200 a 1601, o castelo de Donegal foi a residência principal da família real O’Donnell, que governava o reino de Tir Chonaill. O castelo, por razões defensivas, foi construído numa curva do rio Eske para proteger a região dos dois lados do rio. Anteriormente, nos séculos IX e X, o castelo foi usado como forte Viking.

O castelo está dividido em sete secções; a Casa da Torre, a Mansão, as Arrecadações que ficam no piso do rés-do-chão, a Escadaria Trip, o Guarda-Roupa, o Salão dos Banquetes e as Câmaras acima do Salão dos Banquetes.

A Tower House foi restaurada e ergue-se acima da Manor House. Os registos históricos mencionam a ‘nova Torre’ em 1563, no entanto sabe-se que Red Hugh O’Donnell construiu o castelo em 1474 podendo ter sido nessa altura que a torre foi erguida. Os torreões foram acrescentados e as janelas ampliadas no início do século XVII pela família Brooke que adquiriu o castelo em 1610, altura em que o capitão Basil Brooke, soldado inglês, foi coroado pelo seu papel na Nine Years War (guerra dos noves anos).

Manor House foi acrescentada ao castelo em 1623 e pode ser acedida por uma escada de madeira que leva até à porta elaboradamente esculpida no segundo andar. A entrada de estilo gótico e românico do rés-do-chão dava por seu lado para a zona dos criados.

Podemos dividir estas arrecadações em duas secções; na primeira secção os tectos em abóbada ruíram antes da restauração do castelo entre 1989 e 1996, enquanto que na segunda secção a construção permaneceu intacta.

Na entrada, à esquerda, encontram-se os brasões das famílias O’Donnell e Brooke. O mastro de um veleiro, o brasão dos O’Donnells conhecidos como ‘Reis dos Peixes’, representa o seu papel na extensa exportação de peixe durante o seu reinado. No século XV a porta do castelo que se encontrava ao fundo da escada de pedra em caracol foi retirada e substituída por uma parede para suportar a janela saliente do Salão dos Banquetes do segundo andar.

Esta escadaria tem uma particularidade; os seus degraus são irregulares para que quando o castelo fosse atacado, os inimigos tropeçassem neles. Outro pormenor da sua construção é o sentido das escadas que sobem para a direita, isto porque os O’Donnell sendo destros tinham assim mais espaço na curva das escadas para atacar os seus inimigos.

No interior da câmara deste guarda-roupa encontrava-se aquilo que se podia chamar de sanita. Diz-se que a vala aberta que levava os ‘dejectos’ pelo rio abaixo era bastante inclinada para que um arqueiro inimigo não pudesse apanhar alguém de surpresa.

Por outro lado, este ‘roupeiro’, funcionava também como vestiário. Aqui foram abertos buracos nas paredes onde se encaixavam bastões que suportavam uma espécie de banco onde as pessoas colocavam as suas roupas para puderem beneficiar das supostas propriedades desinfectantes do amoníaco usado para desinfectar a sanita.

A parte mais notável neste salão é a elaborada lareira, uma das melhores do género na Irlanda (ver imagem abaixo). No canto superior direito pode-se ver o brasão da família Brooke. No canto superior esquerdo encontra-se o escudo de Lady Brooke, dividido em 2 partes, à esquerda está representado o marido pela cruz e à direita a flor-de-lis do brasão de Leicester, de seu pai. Na parte inferior da lareira encontra-se uma fila de rosas que simbolizam a coroa inglesa. Ao fundo da lareira encontra-se o emblema do seu primo, rei James VI da Escócia.

Lareira no Salão dos Banquetes

Para além da lareira, neste salão também se encontram cadeiras e uma mesa, réplicas de mobiliário da época, tal como tapeçarias, instrumentos musicais, a cabeça de um javali e os chifres de um veado.

No nível acima do Salão dos Banquetes acredita-se que havia duas câmaras, uma que funcionava como quarto principal e outra como escritório administrativo. Durante o século XVII mais divisões foram adicionadas as quais serviram como dormitórios para solados, crianças ou criados.


Para última noite escolhemos o Mill Park Hotel, um hotel de 4 estrelas, a 14 minutos de distância (a pé) do centro de Donegal (3 minutos de carro). Também neste hotel partilhámos o quarto, tal como fizemos durante toda a viagem, e a estadia ficou-nos a 220 euros (73 euros a cada um). Fizemos a reserva a partir do website oficial do hotel ficando-nos mais barato do que se o tivéssemos feito através de outro serviço como Booking.com ou Hotels.com. O site oficial do hotel pode ser acedido através deste link: https://www.millparkhotel.com/

Depois de fazermos o check-in e pormos as nossas malas no quarto decidimos aproveitar todas as acomodações que este hotel oferecia. E assim em menos de nada estávamos no Leisure Centre dividindo o tempo entre a piscina, a sauna e o jacuzzi. Segundo a política do hotel obrigatório usar toca dentro da piscina e não a tendo trazido, tivemos que a comprar no Leisure Centre por 3 euros.

O uso das instalações estava incluído no preço da reserva do quarto e para aproveitarmos ao máximo também na manhã seguinte, antes do pequeno-almoço, voltámos aqui.

Decidimos jantar no restaurante do hotel, Chapter Twenty, para depois irmos até a um pub irlandês onde houvesse música ao vivo. Não foi preciso marcar mesa, mas o restaurante estava bastante cheio naquela noite. No entanto, o serviço foi rapidíssimo e a comida era bastante boa.

Entradas potato skins e spring rolls

Pedimos spring rolls e potato skins para entradas que dividimos pelos 3. Para prato principal acabei por escolher o Chapter Twenty Burguer com salada e batatas com alho e queijo, que foi uma variação das normais batatas fritas. Apesar dos pratos não serem tipicamente irlandeses a qualidade dos produtos tornou esta refeição mais memorável, aquela que seria o início do nosso ‘Adeus à Irlanda’.

Como estávamos cheíssimos já não houve espaço para sobremesa, mas pelo aspecto das que foram servidas em outras mesas, talvez valha a pena considerar substituir as entradas pelas sobremesas consoante a preferência do momento.

Prato Principal Chapter Twenty Burguer

Já me adiantando para a manhã seguinte, passo agora para o pequeno-almoço. O pequeno-almoço servido em formato de buffet tem imensas escolhas. Para pequeno-almoço continental há uma selecção variada de cereais, frutas e iogurtes e também de pastelaria. Para o pequeno-almoço cozinhado pode-se escolher entre vários componentes do pequeno-almoço inglês e tirar as vezes que se quiser. Nós depois do jantar da noite anterior nem tínhamos muita fome, mas mesmo assim conseguimos experimentar uma boa selecção dos itens disponíveis.

Mesa de pequeno-almoço no Hotel Mill Hill

Para a última noite na Irlanda tinha pedido aos meus amigos para irmos ver música ao vivo. Ouvir música tradicional irlandesa num pub faz parte da tradição e cultura do país e não é preciso procurar muito para encontrar um pub onde se possa ter essa experiência.

Sem direcção certa depois do jantar seguimos pelas ruas até ao centro de Donegal acabando por entrar no pub The Reel Inn. O pub estava cheíssimo mas tivemos muita sorte e conseguimos uns assentos num dos cantos da sala principal onde se podia ver os músicos. Não sei porquê mas ouvir este tipo de música dá-me uma nostalgia enorme.

Depois de várias bebidas e levados pelo ambiente e pela música que se espalhava pelo pub decidimos experimentar um cocktail que levava uma bebida tradicional, o Irish Poitin. O Irish Poitin também conhecido coloquialmente como Irish Moonshine foi proibido na Irlanda durante 300 anos. Esta bebida pode chegar aos 90% de álcool e é uma das bebidas mais fortes do mundo. Claro como tudo o que é proibido as pessoas continuaram a produzi-lo e a consumi-lo às escondidas. Tudo mudou em 1997 quando a bebida se tornou legalizada sendo possível agora bebê-la em público, uma bebida que representa parte da cultura e história irlandesa.

Ainda antes de acabar a noite, já a caminho do nosso quarto, parámos no bar do hotel para um Irish Coffee e mais dois dedos de conversa. Apesar de nesta altura já tudo parecer bem pelo vistos um bom Irish Coffee tem as camadas de café com whisky e natas bem definidas. Como disse a esta hora já não importava.

Esta é a segunda maior cidade da Irlanda do Norte sendo apenas ultrapassada pela capital, Belfast. O nome da cidade traz várias disputas e por isso escrevo aqui das duas formas em que é conhecida, Londonderry e Derry. Oficialmente chama-se Londonderry e assim o é desde 1613 quando o rei James I adicionou London a Derry. Esta é a forma escolhida por aqueles que são os chamados de Unionistas (Unionists) normalmente da religião Protestante. Os Unionists acreditam que a Irlanda do Norte deve pertencer ao Reino Unido, como o é actualmente. Por outro lado, Derry é a forma que os nacionalistas preferem chamar a cidade. Estes, normalmente da religião católica, acreditam que as duas Irlandas deviam-se unir e formar um só país, país esse independente da Inglaterra.

Londonderry/Derry, vista das muralhas

Como já falei em outras páginas sobre a Irlanda, especialmente quando falei sobre a Irlanda do Norte, há ainda hoje uma grande tensão política entre nacionalistas e unionistas, sendo o mais recente conflicto conhecido como ‘The Troubles’ que decorreu no final do século XX (década de 1960 a 1998). Como podem ver este grande conflicto é bastante recente e mesmo nos dias de hoje é um tema sensível e do qual é preciso algum cuidado quando mencionado na Irlanda e Irlanda do Norte. Foi sobre isto que o meu amigo nos alertou quando chegámos à cidade; para não falarmos abertamente sobre o nome da cidade, pois a forma como a chamaríamos seria associada a uma crença na parte nacionalista ou unionista e que podíamos ser assediados porque quem nos ouvisse. Não quero com isto dizer que nos sentimos inseguros ou com medo, de forma alguma, mas como algo a evitar se pudéssemos.

Estacionámos o carro na margem direita do rio Foyle e atravessámos a ponte da paz (The Peace Bridge) em direcção ao centro da cidade. A ponte foi inaugurada a 25 de junho de 2011 e o seu nome simboliza a significativa melhoria das relações da parte da cidade maioritariamente unionista, na margem direita, e a parte maioritariamente nacionalista na margem esquerda, onde fica o centro histórico. A ponte foi financiada pelo departamento do desenvolvimento social, o departamento do ambiente e o departamento da comunidade e governamento local para alcançar uma melhor relação entre as duas zonas de diferente crença política.

Ponte da Paz

Para além do simbolismo desta ponte a sua construção é delicada com curvas subtis oferecendo uma bonita paisagem das duas margens divididas pelo rio Foyle.

Como o tempo começou a piorar entrámos em Guildhall (o edifício da câmara municipal). A entrada é gratuita e está aberto aos visitantes desde as 9 da manhã até às 8 da noite, de segunda a sexta, e até às 6 da tarde durante o fim-de-semana. Aqui fomos encontrar várias exposições focando-se em diferentes partes da história do país, da cidade e do próprio edifício.

Aqui deixo alguns breves pormenores daquilo que aprendemos nas exposições que visitámos em Guildhall. Para quem estiver interessado, é possível fazer uma tour virtual 3D ao edifício que está disponível através deste link: https://guildhallderry.com/take-the-tour/

A Guerra dos Nove Anos envolveu vários países da Europa contra Inglaterra. No final, Inglaterra saiu vencedora e pela primeira vez o rei de Inglaterra, James I, passa também a governar a Irlanda e a Escócia. Foi aqui que oficialmente começou o período da história chamado de Plantation of Uslter que decorreu entre 1609 e 1690. Em linhas muito breves, esta foi uma tentativa de repovoamento da região de Ulster com pessoas vindas da Inglaterra e Escócia para anglicização desta zona da Irlanda em detrimento dos irlandeses que aqui viviam, considerados como selvagens pela coroa inglesa.

Eu não vou entrar em grandes pormenores, podem encontrar facilmente mais informações sobre a Guerra dos Nove Anos e sobre a Plantation of Ulster na internet. Por isso, vou apenas fazer um breve resumo do que sucedeu durante estes quase 80 anos na Irlanda.

Vitral em Guildhall

O primeiro rei de Inglaterra a governar a Irlanda foi Henry VIII, o criador da Igreja Protestante e conhecido por mandar matar as suas esposas (mais pormenores sobre este rei podem ser lidos nesta página: Hampton Court). Henry VIII tornou-se soberano da Irlanda em 1541 e foi a partir daqui que a coroa procurou constantemente afirmar o seu poder sobre a Irlanda. A partir de 1550, áreas a sul e a oeste da Irlanda foram zonas escolhidas pelos ingleses na esperança de formar aqui colónias. O esquema para repovoamento na zona de Ulster começou mais tarde, na década de 1570, mas rapidamente se tornou claro para a coroa inglesa que seria necessária uma abordagem mais coerente e disciplinada para controlar e domesticar aquela que era considerada a província mais insubmissa da Irlanda.

Em 1609, rapidamente depois da decisão da coroa inglesa em ‘plantar’ Ulster, foi criada uma comissão e publicado o plano detalhado de repovoamento. O primeiro passo a tomar era conduzir um levantamento das terras e cartografá-las. No entanto, havendo uma grande pressão da coroa inglesa em iniciar o processo, o levantamento desta informação foi feito de uma maneira pouco precisa; ‘inquérito por inquisição’. Ou seja, as medidas das terras de Ulster foram obtidas a partir de informação dada pelos locais. Pior ainda era que a medida usada pelos irlandeses para tal efeito era ‘ballyboes’, uma unidade de terra definida pela capacidade de sustentar duas famílias. Como se deve calcular, esta medida seria variável consoante a qualidade da terra para agricultura. Conclusão, os ingleses não conseguindo converter ‘ballyboes’ para acres acabaram por subestimar a área total de Ulster em apenas 1/8 do que na realidade era.

Como era esperado, a cidade de Londres acabou convidada a participar neste projecto de repovoamento. Afinal esta cidade era conhecida como a fonte financeira para a coroa em momentos de necessidade. Foi assim que 55 companhias de Londres se organizaram em 12 grupos e prepararam-se para a lotaria das terras de Ulster.

Pois foi fazendo um sorteio que se pensou dividir as terras de uma maneira justa. Os lotes de terra foram sorteados em Londres a 17 de dezembro de 1613. Claro, que devido aos cálculos grosseiros feitos das terras, todas as Companhias de Londres, sem o saberem, receberam mais terra do que a esperavam. Esta lotaria aconteceu depois de terem sido feitas concessões de terras a alguns irlandeses que eram considerados pela coroa como ‘merecedores’ tal como concessões de terras à igreja. Mas a coroa não só deu piores terras a este grupo como também cobrava rendas mais altas.

Quando o plano de repovoamento foi inicialmente pensado, o objectivo era de remover os irlandeses nativos na sua totalidade, mas bastante cedo a coroa percebeu que tal seria impossível. Marcaram-se prazos para a remoção dos irlandeses, mas estes foram adiados várias vezes até que finalmente foi decidido que nas propriedades maiores seria permitido um pequeno número de irlandeses. Mas também isso era difícil como mostraram os inquéritos realizados em 1619 e 1622, onde afinal o número de irlandeses superava o número de colonizadores em quase todas as propriedades. E claro que não havia um ambiente apaziguador, afinal os proprietários falavam uma língua diferente, praticavam e promoviam uma religião diferente e podiam despejar os seus inquilinos a qualquer momento. Para mais os irlandeses ressentiam-se dos impostos cobrados e da perseguição constante aos padres católicos por uma religião estrangeira

Na década de 1630, o repovoamento apesar de bem estabelecido em Uslter e na cidade de Londonderry era bastante diferente do que a coroa tinha imaginado 20 anos antes. Para os irlandeses nativos, este projecto mudou Ulster de uma forma extrema, tornando-a irreconhecível. Apesar de mais de 30.000 colonizadores britânicos se terem estabelecido em Ulster, estes não só não tiveram sucesso em remover os irlandeses nativos da região como não os conseguiram converter ao anglicanismo. Isto devido em grande parte ao cálculo erróneo das terras disponíveis e da forma como foram divididas. As Companhias de Londres não só não alcançaram os objectivos iniciais de repovoamento e de recuperação dos seus investimentos, como muito menos ainda fizeram as fortunas que lhe foram prometidas.

Muitos venderem as suas terras e aqueles que ficaram, acabaram forçados a confiar nos seus inquilinos irlandeses enquanto se defendiam de ataques e crescentes exigências de uma coroa inglesa que se mantinha impaciente e claro gananciosa.

Guildhall começou a ser construído em 1887 e foi inaugurado ao público em 1890. Este edifício foi concebido por John Guy Ferguson e financiado pela Ireland Society (Sociedade Irlandesa). A arquitectura da torre do relógio foi inspirada pela famosa torre do relógio Big Ben. Foi nesta altura que foi criada uma cápsula do tempo que continha moedas e jornais da época, escondida junta a este edifício.

Dezoito anos depois, em 1908, um incêndio destrói grande parte de Guildhall, apenas deixando intactos a torre do relógio e a parte de trás do edifício. Felizmente em 1912, de acordo com o projecto delineado por Matthew Alexander Robinson, Guildhall é reconstruído, altura em que o grandioso orgão com 3132 tubos, o segundo maior órgão na Irlanda do Norte, passa a fazer Guildhall sua casa. Foi também em 1912 que foi inaugurado o primeiro vitral desenhado por Campbell Brothers.

Um dos eventos mais importantes em Guildhall decorreu em 1953 quando a rainha Isabel II e o seu marido, o Duque Filipe de Edimburgo, visitam a cidade pouco depois da coroação da rainha.

Mas Guildhall também presenciou protestos e conflictos. Por exemplo, em 1959 as mulheres que viviam na base naval em Derry, Springtown huts, juntaram-se em protesto contra as más condições de habitação, protesto esse precursor do movimento dos direitos civis nos anos 60. Mais tarde, em 1972, Guildhall é atingido por duas bombas durante o período conhecido como ‘The Troubles’. Neste bombeamento o órgão e a estátua da rainha Vitória ficam danificados.

Em 1977, depois de Guildhall ser restaurado num processo que custou 1.7 milhões de libras, o edifício é novamente aberto ao público. Outro evento importante em Guildhall decorreu em 1995, sendo este o local onde o presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, discursou durante a sua visita à Irlanda do Norte.

Mais recentemente em 2010 houve um projecto de renovação na qual se encontrou a cápsula do tempo criada em 1887. Em 2013, como resultado deste projecto, Guildhall foi novamente aberto ao público.

A cidade de Londonderry ou Derry, como preferirem chamar, está cercada pelas muralhas construídas em 1613. Enquanto se atravessa este, que é o maior monumento sob os cuidados da Irlanda do Norte com 1.5Km de circunferência, fica-se a conhecer toda a cidade numa diferente perspectiva.

As muralhas foram erguidas como forma de defesa da nova cidade, Londonderry, como resposta da coroa à recente introdução de artilharia na guerra. As muralhas foram construídas com 10 metros de largura e inicialmente formavam apenas uma muralha com 8 metros de espessura. As muralhas tinham 4 portões marcados por torres rectangulares que se elevavam acima das muralhas; Shipquay Gate, Butcher Gate, Bishop’s Gate and Ferryquay Gate. Mais tarde foram adicionados outros portões como se pode ver no mapa abaixo.

Mapa das walls em Londonderry/Derry. Imagem tirada de http://www.ulstergenealogyandlocalhistoryblog.com/2017/12/e-book-maiden-city-inhabitants-of-city.html

Como já falei muito sobre assuntos sérios e pesados, vou agora mencionar um local muito famoso em Londonderry/Derry, por motivos bastantes diferentes. Ou se não famoso, pelo menos é um local especial para aqueles que viram a série Derry Girls.

Este grande mural pode ser encontrado na Orchard Street e representa o elenco da série. A série para quem não conhece segue a vida de um grupo de cinco estudantes no ensino secundário na década de 90 durante os ‘The Troubles’. A série de comédia foi vencedora do prémio BAFTA TV.

Mural Derry Girls

Eu pessoalmente nunca vi a série, mas para quem vive na Irlanda ou em Inglaterra ela é bastante conhecida. Ou pelo menos assim deram entender os meus amigos que vieram comigo nesta viagem, um deles de Belfast e outro de Londres. Talvez tenham interesse em ver alguns episódios antes de visitarem esta cidade que fica na fronteira entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda.

Acho que a série está disponível na Netflix ou no Channel 4 (canal de televisão inglesa).

Antes ainda de deixarmos a cidade fizemos uma paragem no Guildhall Taphouse que fica mesmo ao lado do edifício de Guildhall.


Como chegámos com uma alguma antecedência à zona do aeroporto fizemos uma paragem de meia hora em Antrim Castle Gardens. Quando estacionámos já estavam para fechar a Clotworthy House tal como o Antrim Platinum Jubilee Clockwork Garden, apesar de a música ainda tocar. No entanto, a parte da floresta estava aberta ao público e pudemos ainda ver as ruínas do castelo e atravessar o jardim Her Ladyship’s Pleasure Garden.

Não ficámos muito tempo, afinal com muita pena nossa tínhamos mesmo um avião para apanhar, mas este é um dos locais ao pé de Belfast que com certeza valerá a pena considerar por quem visitar a Irlanda do Norte.

De coração cheio saímos da Irlanda com muitas memórias e com a certeza que podíamos deixar a Irlanda mas a Irlanda nunca nos deixaria.

Cliquem em baixo para ver para outros locais da Irlanda a visitar.